Certa vez, a única em minha vida – devia ser 1996, possivelmente – fui me consultar com uma Taróloga. Foi muito interessante a consulta e uma das coisas que ela falou foi que, se eu quisesse ser ator, eu teria que estudar muito. Algo que me parecia óbvio, e rapidamente, eu respondi: “Mas eu estudo, faço a escola técnica Célia Helena”. Então ela disse: “Não, você terá de ir além, terá de se aprofundar nos estudos”.

Naquele momento não estava muito claro que tanto estudo aprofundado eu deveria fazer. Os anos foram passando e sem que eu ‘propositalmente’ seguisse o conselho da taróloga, estava na trilha dos estudos. Saltamos agora pra 2003, quando eu já tinha terminado o Célia Helena (em 1997) e me tornado ator profissional. Já estava trabalhando no mercado teatral e tudo mais. Nos estudos, terminei a faculdade de Comunicação das Artes do Corpo (PUC/SP) e, paralelamente, já estava avançando para o segundo ou terceiro ano no conservatório em viola caipira na EMESP (antiga ULM). Pra mim já estava claro que a necessidade de estudar tinha também ligação com minha atividade pedagógica, já que comecei a dar aulas desde sempre – ainda no terceiro semestre enquanto aluno na escola técnica de teatro, já era um jovem professor, atividade que sempre tive paralelo aos trabalhos práticos como ator e músico. 

Desde antes do início da faculdade, meu interesse pelo corpo humano era enorme, tanto na área da saúde, quando na área artística, da expressão do corpo e suas possibilidades estéticas na cena.

Desde criança estudava música, e naquele momento que estava no conservatório musical, em mim pulsava muito o interesse latente em cruzar o conhecimentos da música com o do teatro para pesquisar a relação do corpo e seus atravessamentos em cena, como um agente/agenciador dos acontecimentos e ações. Então, entrei na pós graduação para pesquisar essas relações e cruzamentos de linguagens. O processo de pesquisa – que de lá pra cá nunca terminou – foi incrível.

Em 2006, fiz a defesa para a banca, que foi, de fato, uma apresentação performática no Teatro Oficina. Tive a honra de ter na plateia o grande Bóris Shnaiderman. Os professores examinadores foram Jerusa Pires (PUC), Rogério Costa (USP) e o Silvio Ferraz, meu orientador, que era da PUC e UNICAMP e agora está na USP. Eles ficaram muito contentes com a experiência de fazerem a banca fora de ambiente acadêmico, e especialmente naquele espaço concebido por Lina Bo Bardi, arquiteta magistral. E lá eles estavam, no Teatro Oficina, para assistirem a defesa de minha dissertação de mestrado: a performance Olho Caos, com participação dos artistas maravilhosos: Auro Porto (Performer-Corpo), Irene Selke (concepção de iluminação), Fernando Coimbra (vídeo-arte), Dipa (técnico de som) e eu 🙃(Performer-Voz).

Como resultados práticos dessa pesquisa, temos, além da performance, trabalhos como “Dança Viola” e “Moda à Terra“.

Veja abaixo a performance “Olho Caos” completa:

E clique aqui para baixar a tese de mestrado completa, em PDF ou acesse também pela Biblioteca da PUC.

Título: Música e(m) Cena: processo de criação em mídias diversas

Resumo:

Música e cena sempre se correlacionaram. Ao longo da história, foram desenvolvidas diversas formas de relacioná-los. Com o intuito de entender os princípios que motivaram o desenvolvimento entre os componentes musicais e cênicos, essa dissertação de mestrado tem por objetivo pesquisar essa forma de relação como um processo híbrido de criação atualmente implicado nas mais diversas mídias. O que se pretende com isso é entender os modos de relação do som com os elementos dramáticos: o texto falado ou cantado, ou mesmo a trilha sonora, e o corpo (gesto, iluminação, espaço e outros mecanismos de captação e registro). O trabalho apresenta um histórico detalhado das formas de relação entre as duas linguagens (o texto e o som) bem como outros elementos que possam concorrer à cena. As bases conceituais empregadas para tal leitura foram tomadas de Gilles Deleuze, Paul Zumthor e Haroldo de Campos. Desses autores, alguns conceitos são fundamentais: de Deleuze, os conceitos de ritornelo e devir, de Zumthor, os estudos de oralidade e as relações entre voz cantada, voz falada e a presença do corpo no acontecimento performático; e de Campos, o conceito de tradução.

A dissertação apresenta-se em duas partes, com dois capítulos cada uma. A primeira traz um mapeamento da relação entre as duas linguagens, desde seus primórdios até as decorrências mais recentes trazidas pelas novas mídias. A segunda parte estuda dois casos de relação entre a criação sonora e a criação cênica, focalizando, sobretudo, o processo de criação em mídias distintas que apresenta o corpo como o elemento de acoplamento das camadas visuais e sonoras. Junto ao texto teórico e analítico, há dois registros em mídia digital, dos dois trabalhos analisados disponibilizados em formato completo no site: www.myspace.com/ricardonash